

Falando de Mercado: Incertezas sobre a política comercial dos Estados Unidos impactam as exportações de petróleo da Colômbia
- 6 de maio de 2025
- : Crude
A demanda e os preços do petróleo colombiano subiram em meio a expectativas de que o país tiraria fatia de mercado do México e do Canadá devido às tarifas de importação dos Estados Unidos. Junte-se a João Scheller, especialista da Argus focado nos mercados de petróleo da Colômbia, Equador, Argentina e Guiana, e Camila Fontana, chefe adjunta de redação da Argus no Brasil, para saber mais sobre a recente dinâmica de exportação de petróleo na América Latina em meio às incertezas sobre a política comercial do presidente Donald Trump.
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Transcript
Camila Fontana: Olá pessoal! Estamos de volta com Falando de Mercado, o podcast semanal da Argus sobre os setores de commodities e energia. Eu sou Camila Fontana, chefe adjunta de redação da Argus no Brasil, e hoje eu converso com o João Scheller, responsável pela cobertura do mercado de petróleo na Colômbia, Equador, Argentina e Guiana.
Produtores, consumidores e traders de petróleo no mundo inteiro estão reagindo às idas e vindas da política comercial do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump. Meu convidado de hoje vai contar para a gente como essa dinâmica está impactando a demanda e os preços do petróleo produzido pela Colômbia, que é exportado principalmente para os Estados Unidos. E aí com repercussões para além da América Latina.
E claro, a gente inicia essa discussão dando um contexto para os nossos ouvintes. João, para a gente começar, você poderia falar sobre quanto petróleo a Colômbia produz e a importância desse país no cenário internacional? Que tipo é esse petróleo? Quem compra?
João Scheller: Claro. Bom, primeiramente, obrigado por me receber aqui, Camila. A Colômbia é uma produtora de petróleo relevante aqui na região. A produção colombiana é de cerca de 700.000 barris por dia. Esse petróleo, como você bem mencionou, em sua maior parte, vai para os Estados Unidos, em especial para a região do Golfo dos Estados Unidos que tem uma ligação, digamos que quase direta com a Colômbia. Você não precisa, por exemplo, passar pelo Canal do Panamá para chegar à costa pacífica, e o trajeto é rápido, leva alguns dias.
O petróleo colombiano ele é um petróleo pesado e com um nível de enxofre mais elevado. Tipos de petróleo variam, a gente tem tipos de petróleos mais leves, de nível médio e pesado. O colombiano se enquadra nessa categoria de petróleo mais pesado. Diferente de outros países da região, por exemplo o Brasil, com os óleos extraídos da região do pré-sal são petróleos mais medianos, digamos assim.
E na Argentina, por exemplo, em Vaca Morta, uma região que tem se desenvolvido bastante nos últimos anos, a gente tem um petróleo leve, por exemplo, que é um petróleo parecido com o que é produzido em grande parte na região do sul dos Estados Unidos. Então o petróleo colombiano ele tem essa característica e essa característica ela é importante para definir para onde ele vai.
Diferentes refinarias têm diferentes tipos de dietas, como o pessoal chama no mercado, ou seja, elas compram diferentes tipos de petróleo para conseguir ser utilizados nos seus aparelho, nas suas refinarias. E o petróleo colombiano é muito utilizado na região do Golfo, assim como óleos de outras regiões, como alguns óleos do México e óleos pesados do Canadá.
A gente vai falar um pouco mais sobre isso no episódio, sobre como o papel desses dois países é relevante para a gente entender o que está se passando com o preço dos petróleos da Colômbia.
CF: Agora vamos entrar na questão das tarifas e a ameaça de tarifas, né, porque teve o que foi concretizado e o que não foi. Idas e vindas. Você dá um panorama para a gente do que aconteceu aí nos últimos tempos, desde que o presidente Trump assumiu o governo e começou a falar de uma nova política comercial.
JS: Claro, como você mencionou, foram idas e vindas. Acho que a gente pode voltar um pouquinho no tempo para novembro de 2024. A gente tá ali algumas semanas...
CF: Depois da eleição, né?
JS: Exatamente.
CF: Ele ainda não tinha assumido efetivamente o cargo.
JS: Exato...
CF: A transição...
JS: Para você ver o quão curioso a situação. A gente tem alguns meses antes de Trump assumir, já um burburinho no mercado relacionado a como seriam as políticas públicas do governo republicano.
Então a gente chega em novembro. No final de novembro de 2024, Trump anuncia que ele tem planos de tarifar todas as importações para os Estados Unidos de produtos canadenses e mexicanos.
CF: Não citou colombianos.
JS: Não, exato. Aparentemente, não é algo que vai afetar a Colômbia diretamente.
CF: Não estava na mira.
JS: Apesar de que ele de fato menciona a Colômbia depois num atrito que ele tem com o Gustavo Petro no comecinho do ano, mas que durou poucos dias. Foi um dos primeiros episódios de embate do Trump com parceiros comerciais. Mas em novembro, ele menciona essas tarifas contra o México e o Canadá, que seriam implementadas quando ele assumisse.
E, por ora, o mercado achou preocupante, porque as principais exportações de petróleo, especificamente para os Estados Unidos, são canadenses e mexicanas. Então, caso fosse implementada uma tarifa de 25pc, seria algo relevante. Mas ninguém levou muito a sério, se imaginava que era um blefe. O Trump já tem esse perfil de “jogar o anzol para ver se alguém fisga”. Ficou assim em novembro, ficou assim em dezembro. Mas chegou ali no final de janeiro, perto da data de posse de Trump, se mudou um pouco essa percepção.
A ideia era de que, se ele não tinha voltado atrás no que ele tinha falado, era provável que talvez aquilo fosse de fato acontecer. E é nesse momento, o petróleo colombiano começa a subir de preço. E por que isso?
O petróleo colombiano, de fato, já tem nos Estados Unidos o seu principal mercado exportador. Mas com essa imposição de tarifas nos óleos mexicanos e canadenses, a gente teria uma diminuição de exportações desses dois países para os Estados Unidos invariavelmente. A gente teria, imagina, um aumento de 25pc do preço de todas essas cargas.
Então, o petróleo colombiano, que tem uma característica muito parecida com esses petróleos pesados do México e do Canadá, se posicionaria como um substituto ideal e muito bem localizado geograficamente. Isso porque, por exemplo, a gente tem o Equador, que tem um petróleo parecido e também é pesado, também tem um teor de enxofre um pouco mais elevado, mas fica na Costa Pacífica. Para você chegar no Golfo, você tem que passar pelo Canal do Panamá. O custo é muito maior, demora muito mais tempo.
Então, no final das contas, foi uma situação perfeita para esses produtores colombianos.
CF: Muitos fatores favoráveis.
JS: Muito fatores favoráveis, exatamente. E assim foi estabelecido essa situação. A Colômbia tinha essas cargas, os preços começaram a subir paulatinamente, não foi tudo de uma vez só.
Qual que era a lógica da situação? O refinador do Golfo olhava para a situação e falava: “Poxa, é provável que daqui a um mês ou dois toda a carga comprada do Canadá vá aumentar em 25pc. Então, é melhor eu tentar encontrar algum outro tipo de petróleo que eu possa comprar com preço mais atrativo.”
Tentando se antecipar às tarifas, porque, é bem provável, caso as tarifas de fato fossem implementadas, a gente já vai chegar nisso, o preço do petróleo colombiano não ia subir só um pouquinho, mas iam subir muito. Então, esses produtores, esses refinadores americanos tentavam buscar essas cargas como forma de se antever a essas tarifas.
O que acontece é que os preços foram subindo um pouco em janeiro, e aí chegamos no começo de fevereiro, quando de fato as tarifas iriam ser implementadas. E o Trump, um, dois dias depois, adiou. Jogou para o mês seguinte e deixou o mercado em espera.
O preço do petróleo colombiano sobe mais um pouco no mês de carga seguinte. Chegamos em março, o Trump adia novamente, passa um, dois dias ele adia para para abril o início das tarifas.
CF: E aí, 2 de abril.
JS: E aí 2 de abril, exatamente. No final das contas, ele acabou condensando todas as tarifas que ele gostaria de implementar no dia 2 de abril.
CF: Lembrando que é o que ficou conhecido como o dia da...
JS: Liberação... Libertação... Exato. O tarifaço.
CF: E ai, o que aconteceu?
JS: O que acontece é que o Trump chega no dia 2 de abril e decide não incluir o México e o Canadá na lista de países que seriam taxados pelos Estados Unidos.
Ele passou de novembro até o final de março ameaçando colocar as tarifas e as retirou. Tem um acordo de livre comércio entre Canadá, Estados Unidos e México, o antigo NAFTA, inclusive. Basicamente, o que foi delimitado é que todos os produtos que estavam dentro dessa lista de produtos que englobavam a área de livre comércio se manteriam assim.
Alguns produtos não se enquadram nessa lista, mas a grande maioria, sim. E os produtos de commodities também.
Ou seja, tivemos todo esse burburinho. Afetou os mercados do Canadá, México. Afetou o mercado colombiano, como a gente mencionou. Mas, no final das contas, nada mudou.
Então, a gente teve esse aumento dos preços colombianos nos últimos três meses só com as ameaças de tarifas, sem as tarifas de fato serem efetivadas. Só para a gente situar o ouvinte, a gente está falando de um aumento muito relevante. A gente está falando de um preço, no petróleo a gente trabalha o preço com diferenciais. Um diferencial em um dos níveis mais elevados dos últimos quatro anos, então, de fato, afetou muito o mercado da região.
Mas, a partir do momento em que o Trump volta atrás nessas ameaças tarifárias contra Canadá e o México, o petróleo colombiano também se desvaloriza.
CF: O sonho acabou.
JS: Exatamente, o sonho acabou. Os refinadores no Golfo percebem, é, não tinham mais porque buscar o óleo colombiano como substituto. Mas a gente teve outros fatores também.
CF: Então, é isso que eu queria conversar com você, João. Que outros fatores estão afetando a demanda, as perspectivas para o petróleo colombiano, comparando com o de outros países como o próprio México que você mencionou.
JS: Camila, o que acontece é que a gente teve outros acontecimentos nesse meio-tempo que eventualmente afetaram esse mercado colombiano. Talvez o principal deles tenha sido a revogação da licença da Chevron de operar na Venezuela. A Chevron é uma empresa americana major do setor. Ela tinha uma joint venture com a PDVSA, já que a estatal de petróleo venezuelana. Operava no país.
Eventualmente, por conta das sanções que os Estados Unidos impuseram à Venezuela por conta do regime do Nicolás Maduro, a gente teve a revogação dessas licenças.
Acontece que no ano passado também, ainda durante a administração do Biden, a gente teve uma permissão de licença para a Chevron continuar produzindo e exportar esse petróleo produzido na Venezuela para os Estados Unidos.
Tiveram uma licença também, como para a Repsol, na Espanha, em que eles recebiam o petróleo venezuelano. Eles recebiam esses valores para abater pagamento de dívidas. Enfim, o fato é que voltava se a ter algum tipo de troca comercial com a Venezuela. Isso como uma moeda de troca com o Nicolás Maduro para que as eleições venezuelanas de 2024 fossem realizadas de forma enfim, limpa, justa. Eleições livres, digamos assim.
Essa licença continuou funcionando. A Chevron continuou exportando para os Estados Unidos, em especial para o Golfo dos Estados Unidos, cerca de 200.000 barris por dia.
Esse volume não é elevado ou tão elevado para os refinadores do Golfo, mas ele é muito elevado se a gente pensar na região em que se encontra a Venezuela, se a gente pensar na produção da Colômbia, por exemplo, que está ali do lado, e na quantidade de petróleo que vai deixar de ir para esse principal mercado consumidor do petróleo colombiano.
Então, a licença da Chevron inicialmente ia ser revogada no final de abril. Isso foi postergado para o final de maio e a partir desse momento a gente não vai ter mais petróleo venezuelano indo para os Estados Unidos.
E aí abriu-se uma outra oportunidade para os produtores colombianos enviarem os seus barris para região. Claro, isso não tem nível de comparação, o nível de relevância para os preços tão grande quanto, por exemplo, a imposição de tarifas para os principais parceiros comerciais dos Estados Unidos.
Tanto que os preços colombianos arrefeceram desde que o Trump anunciou o não-tarifamento contra o Canadá e contra o México. Mas sim a Venezuela é um fator. A gente tem o México, o próprio México mesmo tem tido problemas de produção e a produção de petróleo mexicano tem caído nos últimos anos.
A gente tem tido problemas de qualidade em alguns tipos de petróleo que também vão pro Golfo. Então a Colômbia se posicionaria como uma substituta. Mas nada, de novo, comparável com o que foi o aumento por conta das tarifas. É isso que pelo menos dizem as nossas fontes na Colômbia de que o preço tem se mantido como está por conta desses fatores adjacentes. Mas ainda assim nada comparado com o que estava antes.
CF: Ótimo, muito obrigada ao João, muito obrigada aos nossos ouvintes.
A Argus, claro, vai continuar trazendo para vocês as discussões sobre o petróleo, a commodity mais negociada no mundo.
Lembrando que estes demais episódios do nosso podcast estão disponíveis no site www.argusmedia.com/falando-de-mercado
Visite a página para saber mais sobre os acontecimentos que pautam os mercados globais de commodities.
A gente volta em breve com mais uma edição do Falando de Mercado. Até a próxima!
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